Photo: Ernesto Rodrigues with Guilherme Rodrigues and Toshihiro Koike
Se há coisa que mais distingue as novas práticas da improvisação das “mainstream”, sem ser a utilização do silêncio e o abandono da narratividade nas execuções instrumentais, é o facto de os seus protagonistas preferirem deixar-se levar pelo fluxo dos eventos sonoros em vez de os dirigirem – aliás, a preocupação da “velha” música improvisada com a conclusão das peças chega a ter dimensões algo neuróticas, dada a necessidade sentida de conduzir as situações a todo o custo, seja segundo o modelo estático herdado do free jazz coltraneano, no qual o fim é sempre implicado, ou segundo o padrão desenvolvimentista, cujas mudanças de direcção e de intensidade (as tão irritantes subidas e descidas) justificam o uso do termo “composição imediata” e que, parecendo deixar o final “para depois” no ziguezaguear ou no subir e descer das suas estruturações, não fazem mais do que o anunciar. Pois os chamados “reducionistas”, de que a portuguesa Creative Sources Recordings se tornou no principal porta-voz, não compõem, limitando-se a tocar o que ouvem e a ouvir o que tocam, de tal modo que o tocar é a extensão do acto de ouvir. Os mais recentes lançamentos da editora são exemplos muito concretos desta perspectiva a-linear da música, e se em muitos casos é mesmo de supor um alheamento relativamente a tudo aquilo que define a música enquanto tal, ainda que encarada apenas como “organização de sons” (quase total ausência de dinâmicas, inexistência de repetições, opção pelas parasitagens sonoras e pelo ruído, ou seja, pelos sons não-musicais), a musicalidade surge como uma citação e uma lembrança, na forma de um tom, um breve fragmento de melodia, um harmónico ou uma pulsação, a música remanescente no interior de uma invocação directa (porque não mediatizada musicalmente) do Som, chamada a intervir não para definir ainda estas práticas como coisa musical, mas precisamente para salientar por contraste esse outro estatuto. […] Rui Eduardo Paes
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