quarta-feira, 16 de junho de 2010














Photo: Ernesto Rodrigues with Andrew Drury



A linguagem é fonte de mal entendidos, mesmo quando a formulação se rege de acordo com a sintaxe, e segundo os preceitos gramaticais correctamente as grelhas de interpretação são subjectivas e sujeitas a variáveis de interpretação. A linguagem dos sons ainda mais, pois rege-se por métricas e lógicas que lhe aumentam exponencialmente as potenciais capacidades receptoras.
Fui assistir a um concerto do Ernesto Rodrigues e da Orquestra de Geometria Variável. Logo no nome temos um programa, de facto estamos face a um quadro de hipóteses flutuante consoante as disponibilidades da sonoridade, e as capacidades do espaço acústico. O local Abril em Maio lembra outros locais, esconsos e clandestinos, para iniciados e amantes. A música, o alinhamento das estranhas sonoridades, enche os interstícios e ocupa a possibilidade de recepção acústica. Por ela passam memórias e afectos com os instrumentos e a vocalização. Os metais atiram-nos para o free jazz e as cordas trazem-nos para uma decomposição da sonoridade em que a melodia é uma improbabilidade mágica.
Uma abertura de espírito gera-se enquanto a polifonia desarmónica de ruídos nos enche o cérebro. Ficamos atordoados e despertos, como quando experimentamos cogumelos mágicos.
Parece não haver princípio, parece não haver fim num tempo que parou e fica flutuante nos sons e na sua hipérbole.
Momentos como este valem um êxtase. Divino como o que se concentra e prolonga. Um som que se ouve no silêncio do conhecimento.
António Eloy

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