sexta-feira, 12 de outubro de 2012
NEAR SILENCE
photo: Ernesto Rodrigues with Christian Wolfarth and Ricardo Guerreiro
[...] Para saber da existência ou não da existência de uma comunidade em Portugal de músicos a praticarem este estilo musical, resolvi entrevistar por e-mail, dois músicos improvisadores, residentes em Portugal e ir assistir a dois concertos destes músicos. O primeiro concerto que assisti - Carlos Zíngaro (violino), Pedro Carneiro (vibrafone) e Carlos santos (laptop) teve partes de near silence e o concerto foi regido (nesses momentos de near silence) pelas técnicas da “threshold music”. Já o concerto dirigido por Ernesto rodrigues, foi um bom exemplo de near silence. Houve uma gestão inteligente do silêncio e todo o evento transmitia ao ouvinte, uma sensação de plenitude e relax. Ernesto Rodrigues (violino, viola, objectos, metrónomo) era um condutor das texturas subliminais que emergiam ao som circundante do palco (o concerto realizou-se na LX Factory e por vezes ouvia-se o som das pessoas que preferiram estar no café a assistir ao concerto); Guilherme Rodrigues (violoncelo, metrónomo) e Nuno Torres (saxofone alto, metronomo), intervinham muito espaçadamente e usando advanced thecnics no uso dos seus instrumentos. Gil Gonçalves (tuba, metrónomo) usava o espectro sonoro dos harmónicos e formants, para criar um som quase “fantasmagórico”. Abdul Moimeme (guitarra eléctrica, metrónomos) tocava em duas guitarras expostas paralelamente uma à outra e com uma tira de metal (usando-a como um arco de violino) conseguia obter som simultâneo de ambos os instrumentos. José Oliveira (percussão, metrónomo) usou inicialmente o piano como instrumento de percussão (usando baquetas diversas), para posteriormente ir para um kit incompleto de bateria. carlos Santos usou durante todo o concerto, o laptop de forma quase inaudível, criando texturas abstractas imperceptíveis. Por vezes - tal era o silêncio que pairava no palco - ouvia-se mais os sons provindos do café do andar de baixo, do que as paisagens sonoras que provinham dos músicos. Este espectáculo foi integralmente gravado directamente para um computador Mac, usando o software pro tools e as entrevistas realizadas por e-mail.
[...] Para o improvisador Ernesto Rodrigues - introdutor desta tipologia em Portugal - o near silence é “a resposta mais objectiva e contundente ao mundo desordenado, caótico e ruídoso em que vivemos. Digamos que faz o contraponto com a rudeza da realidade dos nossos dias. O estilo pode ser caracterizado pela percepção do silêncio ou seja, a consciencialização do mesmo, que se traduz também na economia dos sons – reducionismo”.
[...] Ernesto Rodrigues diz que:“embora se utilizem menos notas (e notas são todo e qualquer som), por outro lado os instrumentos são explorados integralmente, o que se traduz numa panóplia sonora muito mais rica e vasta. Logo, pode-se afirmar que sonicamente os instrumentos são cirurgicamente analisados o que se traduz nas chamadas “extended technics”. A tudo isto é necessário acrescentar um doseamento equilibrado entre som/ruído e silêncio”.
[...] Quis saber de seguida se em Portugal se podia falar da existência de uma comunidade de músicos praticando este estilo musical. Perguntei a Ernesto Rodrigues se ele se considerava de algum modo o pioneiro desta linguagem por cá, e ele respondeu-me assim: “De facto antes de mim, não tenho notícia de que alguém o tenha feito (em Portugal). Mesmo a nível internacional penso que o meu cd “Self Eater and Drinker” (projecto iniciado em 1997), aponta já para muitas das soluções que coetaneamente podíamos observar nas práticas mais representativas desta estética, tais como as escolas de Viena, Londres, Tokio, Berlim, Boston, etc. Nos ultimos 10 anos, tenho tido a preocupação de veicular estas ideias a alguns músicos de Lisboa que penso poderem desempenhar esta funçao com “agilidade” e competência. Fundei o grupo SUSPENSÃO que integra 8 elementos e que está direccionado exclusivamente para esta corrente estética”.
[...] Eu acredito que existe, na realidade, toda uma comunidade de músicos de diversas áreas e de diferentes povos, a fazerem near silence e que este é um estilo musical com características próprias. A forma como usam o silêncio e como o abordam, é uma idiossincrasia desta música. Em Portugal, curiosamente, só encontramos vestígios de músicos a praticarem esta música em Lisboa, o que não terá sido alheio o facto de Ernesto Rodrigues ou Carlos Zíngaro, residirem em Lisboa e um deles - Ernesto Rodrigues - dirigir uma editora de discos, onde publica obras deste género musical e o outro - Carlos Zíngaro - ser um dos músicos mais requisitados para actuar no estrangeiro com nomes cimeiros da música improvisada. Vitor Rua
quarta-feira, 3 de outubro de 2012
Festival MIA
photo: Ernesto Rodrigues with Nuno Torres and Ricardo Guerreiro
Foi completamente distinta a prestação de Ernesto Rodrigues, Nuno Torres e Ricardo Guerreiro, merecendo também a entusiasmada aprovação da assistência. No limiar do silêncio, o concerto só não se aproximou inteiramente do reducionismo, tendência com que está conotado Rodrigues, porque não houve economia de sons. Estavam, no entanto, todos os demais ingredientes desta tendência da improvisação, como a aplicação de técnicas extensivas para o manejo dos instrumentos convencionais em presença, a viola e o saxofone alto, e uma cuidada gestão das texturas, sobretudo por parte do "laptop". A trama urdida requereu a máxima concentração e o certo é que só se notavam os ruídos do exterior: a sala estava muda e expectante. Rui Eduardo Paes
Festival Música Viva (2)
photo: Ernesto Rodrigues with Radu Malfatti and Ricardo Guerreiro
O segundo programa da noite, “Improvisação”, foi verdadeiramente inesperado. O trio, composto por Ernesto Rodrigues (viola), Radu Malfatti (trombone) e Ricardo Guerreiro (computador), executou uma improvisação baseada nos sons do silêncio. Num concerto em que a componente visual complementou e reforçou a componente auditiva – ambas extremamente estáticas, com os instrumentistas praticamente imóveis do início ao fim da improvisação, assim como a evolução extremamente lenta de qualquer gesto musical executado –, acabou por existir uma ausência de tempo linear dos acontecimentos. Deixou-se, a dada altura, de ter a referência do que teria sido o início, o meio ou até o fim, existindo por isso uma nova conceção de tempo, lento, parado em si mesmo, quase como um instante que se repete e varia.
Entre os sons da respiração, o som eólio do trombone, as intervenções minimalistas da eletrónica e os tremolos da viola em pppp e em registos extremamente agudos, criou-se uma atmosfera musical que se traduziu num diálogo “mudo” entre o ensemble, o espaço e o público, em que tudo – até o silêncio - se transformou na improvisação deste trio. Tiago Cabrita
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