O ranger das cadeiras e os automóveis a passar na rua faziam parte da música. Dois russos e dois portugueses apresentaram na Sonoscopia o seu entendimento da improvisação reducionista, indo do extremo da quietude até ao “feedback” controlado.
[...] Após um curto intervalo para que o duo português se instalasse, o reducionismo continuou. Desta vez, os sons viscerais e da rua não se impuseram. O programa foi mais preenchido e estimulante e muito menos tenso. O jogo proporcionado pelos dois saxofones (Belorukov e Nuno Torres) foi bastante interessante.
As combinações tímbricas, a exploração harmónica, o borbulhar, o atrito do movimento circular de uma lata de refrigerante sobre a campânula do saxofone, as dissonâncias e flutuações, pontuaram sobre os “drones” electrónicos, contrastando com a subtileza da viola de Rodrigues. Os sons mais agrestes com que Ernesto Rodrigues atacou o início do concerto (usou um papel ou folha seca e amassou-a no tampo da viola) ou os harmónicos suscitados com o arco, nunca foram estridentes. Também ele “jogou” com as suas ferramentas e soluções, sendo que as cordas foram só uma parte desse jogo. O corpo da viola foi percutido e tocado com todo o arco (crina, parafuso e vara), e pôde ouvir-se bem a ressonância da madeira.
Depois de uma primeira peça, o quarteto brindou a audiência com uma segunda actuação. O estado meditativo (ou contemplativo) do público foi atirado para o prolongamento. João Ricardo (Jazz.pt)